Engenharia e Tecnologia de Alimentos: CREA ou CRQ? (FINAL)

No texto anterior (aqui) foi abordado o conflito do CREA e CRQ e a Engenharia de Alimentos. E agora, finalmente chegamos a última parte desta série de textos sobre CREA ou CRQ.

A PROFISSÃO DE TECNÓLOGO DE ALIMENTOS

A Tecnologia de Alimentos, assim como a Engenharia, também é regulamentada pelos dois conselhos, os de engenharia e os de química. Como se sabe, os cursos de Tecnologia, em tese, possuem um menor número de atribuições quando comparados com os cursos de Engenharia, porém no que se refere à fiscalização, a profissão de Tecnólogo de Alimentos é ainda mais disputada entre esses conselhos, pois as mesmas não se encontram regulamentadas por leis específicas como as engenharias na Lei 5.194/66 e a engenharia química na Lei 2.800/56. Pelo sistema CONFEA/CREA, os tecnólogos em geral estão regulamentados pelo art. 23 da Resolução 218/73:
I - o desempenho das atividades 09 a 18 do artigo 1º desta Resolução, circunscritas ao âmbito das respectivas modalidades profissionais; II - as relacionadas nos números 06 a 08 do artigo 1º desta Resolução, desde que enquadradas no desempenho das atividades referidas no item I deste artigo.
Já pelo sistema CFQ/CRQ, os profissionais estão habilitados pela Resolução 257/2014:
Artigo 1º – São profissionais da Química, nos termos da Resolução nº 198/2004 do Conselho Federal de Química, os Engenheiros de Alimentos, os Bacharéis em Ciência dos Alimentos e as Categorias Profissionais caracterizadas no “Eixo Tecnológico da Produção Alimentícia”, constantes do Catálogo Nacional de Cursos Tecnológicos do Ministério da Educação, ou seja: Tecnólogos em Alimentos, Tecnólogos em Laticínios, Tecnólogos em Processamento de Carnes, Tecnólogos em Viticultura e Enologia, Tecnólogos em Produção de Cachaça, Tecnólogos em Agroindústria e outras que venham a ser incluídas, que atuam nas atividades tecnológicas relacionadas ao beneficiamento, armazenamento, industrialização e conservação de alimentos. Artigo 2º – São atribuições dos Profissionais citados no artigo 1º desta Resolução, a serem conferidas de acordo com a avaliação da Estrutura Curricular e Conteúdos Programáticos das Disciplinas cumpridas nos Cursos de Graduação pelos Profissionais de cada Categoria:
  1. Vistoriar, emitir relatórios, pareceres periciais, laudos técnicos, indicando as medidas a serem adotadas e realizar serviços técnicos relacionados com as atividades tecnológicas envolvidas no beneficiamento, armazenamento, industrialização, conservação, acondicionamento e embalagem de alimentos.
  2. Coordenar, orientar, supervisionar, dirigir e assumir a responsabilidade técnica das atividades envolvidas nos processos de industrialização de alimentos.
  3. Exercer o magistério na Educação de Nível Superior e de Nível Médio, respeitada a legislação específica, e participar do desenvolvimento de pesquisas, ambas as atividades, na área de processamento de alimentos.
  4. Executar análises químicas, físico-químicas, químico-biológicas, bromatológicas, toxicológicas dos insumos, produtos intermediários e finais da indústria de alimentos e no controle de qualidade dos processos químicos, bioquímicos e biotecnológicos envolvidos, utilizando métodos gravimétricos e volumétricos.
  5. Executar análises químicas, físico-químicas, químico-biológicas, bromatológicas, toxicológicas dos insumos, produtos intermediários e finais da indústria de alimentos e no controle de qualidade dos processos químicos, bioquímicos e biotecnológicos envolvidos, utilizando as técnicas e métodos instrumentais.
  6. Efetuar controles fitossanitários, nas etapas de armazenamento, produção, distribuição e comercialização sempre relacionados ao desenvolvimento de soluções tecnológicas a serem utilizadas nos procedimentos industriais de obtenção de produtos alimentares.
  7. Planejar, conduzir, gerenciar e efetuar o controle de qualidade dos processos químicos, bioquímicos e biotecnológicos utilizados nas etapas da industrialização de alimentos, desde a matéria prima, incluindo derivados, até o produto final.
  8. Planejar, conduzir e gerenciar as operações unitárias da indústria química utilizadas em todas as etapas da industrialização de alimentos.
  9. Planejar, conduzir e gerencias os processos químicos, bioquímicos e biotecnológicos, e as operações unitárias utilizadas no tratamento de águas destinadas à indústria de alimentos e dos efluentes líquidos, emissões gasosas e resíduos sólidos.
  10. Efetuar a inspeção das atividades produtivas, zelando pelo cumprimento das normas sanitárias e dos padrões de qualidade dos produtos alimentares industrializados.
  11. Efetuar a aquisição, conduzir a montagem e manutenção de máquinas e equipamentos de implementos e supervisionar a instrumentação de controle das máquinas existentes nas instalações das indústrias de alimentos.
  12. Realizar as atividades de estudo, planejamento, elaboração de projeto, especificações de equipamentos e de instalações das indústrias de alimentos.
  13. Desempenhar outras atividades e serviços não especificados na presente Resolução e que se situem no domínio de sua capacitação técnico-científica, conforme indicar a natureza da Organização Curricular cumprida pelo profissional, a ser definido pelo Conselho Federal de Química.
Pelas descrições das atribuições apresentadas, em suas respectivas normas, por ambos os conselhos, fica claro que no caso dos tecnólogos de alimentos, o conselho mais coerente quanto à fiscalização profissional é, sem dúvida, o CRQ.E isto fica ainda mais evidente com o artigo 3º da supracitada resolução:
Artigo 3º – Para efeito de definição de atribuições profissionais, constantes no artigo anterior, para os egressos dos Cursos da área de alimentos, a avaliação por parte do Conselho Federal de Química das Organizações Curriculares dos Cursos e dos seus Históricos Escolares, deverá levar em consideração os parâmetros constantes do Quadro, a seguir indicado:
química, engenharia de alimentos, tecnologia É notória a precisão com que o sistema CFQ/CRQ trata as áreas voltadas para a profissão de químico de alimentos quando esta é exercida por diplomados em cursos de engenharia, ciência e tecnologia de alimentos, o que de fato não acontece com o sistema CONFEA/CREA. Cabe aqui ainda ressaltar algumas incoerências dentro deste sistema sobre cursos relacionados à tecnologia de alimentos como é o caso da Tecnologia de Laticínios. Analisando a tabela de títulos profissionais da Resolução 473/2002, atualizada até 31/03/2017, observa-se que o título de Tecnólogo de Alimentos pertence ao grupo da Engenharia, modalidade Química ao nível de Tecnólogo; já o título de Tecnólogo de Laticínios pertence ao grupo da Agronomia. Ou seja, há uma notável incoerência, que é muito pouco provável de ser explicada pelos próprios representantes do sistema.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Pela atual situação em que se encontram as duas autarquias federais, CONFEA e CFQ, é sabido que não haverá um consenso entre as mesmas, uma vez que a natureza arrecadadora destas entidades não permite que haja uma iniciativa própria de uma delas com o intuito de se resolver tal imbróglio. Nestas condições, parece ser interessante que as associações de representação de classe, tais como a Associação Brasileira de Engenheiros de Alimentos, tomem a iniciativa de requerer, de ambos os conselhos, um posicionamento consensual de modo a evitar tamanho transtorno. Profissionais Tecnólogos de Alimentos e demais portadores de diplomas correlatos a estes, como Tecnólogos de Laticínios, Tecnólogos de Carnes e Derivados, Tecnólogos de Pescados e Derivados, Tecnólogos de Bebidas, dentre outros, parecem estar numa situação, sob o ponto de vista legal da fiscalização, mais bem confortável para atuar como profissionais da química, uma vez que a profissão de tecnólogo não é citada em lei em seu sentido stricto sensu e, pelo que se observa, possui atribuições pouco específicas no sistema CONFEA/CREA. É possível que no presente momento, a melhor solução seria um Termo de Ajuste de Conduta a ser firmado entre os dois conselhos. É certo que para tal condição progredir, a intermediação do Ministério Público Federal seria indispensável. Fato é que não se pode trabalhar com a ideia de apelo ao judiciário, com recorrente frequência, em virtude destes atos auto-executáveis e totalmente egocêntricos por parte dos conselhos fiscais. É sabido que a tecnologia de alimentos abrange também a tecnologia química, no entanto abrange também o campo da engenharia, em outras palavras, deve haver um consenso entre CREA’s e CRQ’s sobre as definições bem claras, as quais necessitam estar expressas em uma resolução normativa conjunta. Diante do exposto, é possível responder ao questionamento:

como então definir o que pertence ao campo da engenharia e o que pertence à área da química?


Julio Cezar D’Ávila Pereira Paixão Costa é Engenheiro de Alimentos e Mestre em Ciência e Tecnologia de Alimentos. Atuou durante 8 anos como técnico do laboratório de Análise de Alimentos na Universidade Federal do Tocantins. Atualmente é Engenheiro no Escritório Federal de Aquicultura e Pesca no Tocantins e presta consultoria técnica para a empresa de gases industriais.  

Informações sobre a legislação

Publicado em

12 de março de 2018

Palavras-chave

D.O.U nº

-

Tipo

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Ano

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Situação

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Macrotema

-

Órgão

-

* Esta publicação não substitui a legislação oficial

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